Primeiro dia da Casa de Criadores

Foi dada a largada para as coleções de Inverno 2009. É bom abrir o calendário com jovens estilistas, dá frescor, dá esperanças, dá o que pensar, já que muitos deles não estão tão preocupados com tendências, apesar de algumas marcas terem mais apetite comercial do que outras.

Sentei ao lado da Carol Vasone que é sempre uma excelente companhia de desfiles e não é de hoje. Dá para comentar na hora, ver impressões, fica tudo mais fácil, já que na abertura tivemos 1 performance e 6 desfiles.

Uma idéia que funcionou superbem foram as entrevistas feitas pela Maria Prata antes de cada desfile. Sim é melhor que release, porque sendo jornalista, ela não deixa os estilistas ficarem naquela viagem sem fim. Sim, é melhor que os depoimentos do Fashion Rio. Aqui você pode ver tudo.

Uma performance rápida e eficiente dos artistas Renan Serrano e Fernanda Ruivo misturou grafite, hip hop e moda de modo simples e despretencioso. Fazia tempo que a Casa de Criadores não abria assim. Claro, que eu estava mega atrasado, então nem notei que tudo começou uma hora mais tarde.

O primeiro desfile foi do André Phergon. A fonte de inspiração foi (meu também amado) Morrissey, que foi o vocalista da banda mítica The Smiths. Na entrevista com a Maria Prata ele disse que queria fugir do esteriotipos rockers que estão na moda há muito tempo e que ganharam mais gás pós Slimane.

andre

De lá ele trás o preto, o cinza e o branco, mas prefere silhuetas menos coladas, faz misturas interessantes entre tecidos e texturas. Quando as calças são mais justas acontecem em plush, tecido próprio para agasalhos ou em lã, mais próximos das ceroulas. Bom mesmo quando ele solta o cavalo desta mesma calça em lã. Aliás, gosto deste exercício de cavalos exagerados dele.

andre2

Ao final, como todos os estilistas estão buscando hoje, ele também pega certos elementos do esporte e dá um toque de alfaiataria. Quanto mais ele avança nesta área, mais nós saímos ganhando. Ele está no limite entre um pouco de ousadia e comercial, e está indo bem.

nohay

A marca No Hay Banda já teve desfiles elogiados no Fashion Rio, dentro do Rio Moda Hype. O coletivo foi buscar no filme Lili Marlene suas referências para um bom começo de desfile com uma série de vestidos pretos com detalhes construtivos bem preciosos a partir de pregas.

nohay2

Muitas vezes less is more, como neste casaco e calça.

No meio do desfile os looks vão perdendo a força, se complicando desnecessariamente, com tecidos empapelados e nylon fininho que não tiveram o mesmo caimento do começo. Mas as meninas têm talento e com o tempo vão achando seu caminho.

ianire

Ianire Soraluze, que concorreu ao Prêmio Moda Brasil como estilista revelação, partiu do avesso de tudo o que tinha feito. Ela mesmo reconhece que talvez seja cedo para isso, mas mostrou que tem força , persistência e talento. Os modelos da abertura eram bem chics e tem uma forma mais ampla com casacões bem executados e calças pantalonas de cintura alta. Este modelo abriu o desfile e teve uma variação que fechou. Já não parecer Raia de Goya Raia de Goye (que uma leitora atenta me corrigiu, e juro, sempre erro, sorry) é um trunfo nesta área.

ianire2

Os tricôs também apareceram muito bem em vestidos e cardigans lindos tantos nos lisos quanto no jacquard. O problema era o bloco intermediário com tecidos molengas e brilhosos que não deram o mesmo efeito da elegância dos outros.

tuti

Depois, tivemos os desfiles do coletivo Tuti Confusi que vem melhorando a cada desfile, mas ainda falta uma proposta mais elaborada. Muitas vontades, muitas idéias, já começaram a fazer algumas peças melhores, mas ainda tem aquele visual que não enche os olhos.

rober

O Rober Dognani teve uma abertura que me surpreendeu, optando por modelos mais estruturados e curtos, longe do caminho longo-esvoaçante. Mas acabou desbancando esta expectativa quando misturou (demais) future+glam+heroínas, com formas que não se sustentaram no visual.

Até que o mais aguardado da noite, meu querido João Pimenta anuncia que queria trabalhar com formas femininas não usuais no masculino, entre eles a cintura e quadril.

joao

Então, eu já pressentia que seria uma coleção conceitual. Ele é um expert em contruir imagens fortes. No começo, até cheguei a comentar depois com o Jorge Wakabara e tinhamos a mesma anotação: Balenciaga para meninos!

Sim, arquitetura nos ombros e ancas e uma cintura marcadíssima. Ele tem um domínio técnico absurdo, os tecidos eram muito bons, e raramente por estas bandas temos uma discussão de gênero, de limites do guarda-roupa masculino, tão complexo.

joao2

Se no feminino as formas são exploradas ad nauseum, no masculino tudo é muito menos arriscado. Ele não está falando de saias e sim de formas pouco vistas no guarda-roupa contemporâneo. É como se ele voltasse há muito tempo atrás, quando os homens da corte francesa se enfeitavam muito mais, porém, com tudo mais limpo, quase uma foto em P&B sem nenhum acessório ou brocado.

joao3

É bonito ver a idéia de circo e fantoche na atitude dos modelos. Sim, nós meninos somos presos a uma idéia de masculinidade que aos poucos vamos nos desprendendo.

Por um lado, ele tem esta coragem de experimentar e discutir num momento interessante os novos caminhos do masculino, por outro, ele tem que sobreviver, tem que vender como todos. Esta dicotomia avança sobre a cabeça de todos e a cada estação essa fórmula é bem complicada. Se eles apresentam só o certo, aquilo que vai vender, a gente reclama. Se vão longe demais, a gente reclama.

joao4

Então, o melhor é seguir seus instintos mesmo. Fiquei imaginando o desdobrar desta coleção em peças mais comerciais. Até onde ele poderá dar dois passos a frente e até onde ele terá que recuar.

Porém, ficam as imagens e roupas que são para pensar.

FOTOS: Charles Naseh (CHIC)

2 Comentários

  1. Querido aprenda a escrever certo o nome RAIA DE GOEYE

  2. que ótimo né, joão pimenta! amei.


Comments RSS TrackBack Identifier URI

Deixe um comentário